A gente vem do Brasil

*(Texto escrito em Abril de 2019)

A gente vem do Brasil.
Lá todo mundo é meio assim... inseguro.
A gente treme as pernas diante de autoridade estrangeira.
Ou treme ou abre.
Os espertos abrem. Os que insistem em serem corretos, sem o serem, tremem.
A gente é tudo assim mesmo lá.
A gente até tem diploma de médico, de advogado, de engenheiro... a gente consegue estudar um pouco.
Mas treme e gagueja sempre.
O senhor deve entender nosso lado.
A gente mal saiu de um longo período de ditadura, de um tempo sem democracia, não fazia nem maus 30 anos e já nem sabemos que rumo vamos tomar por lá. Desandou tudo de repente.
O povo pirou e colocou um pirado pra despirar tudo e só piora a piração.
Claro.
O senhor não deve esquecer que a gente até pouco tempo era tudo índio... sem ler nem escrever o que vocês já sabiam. A gente era índio e sabia o que já sabíamos... o que os avós ensinaram. Aí veio todo mundo daqui pra lá... inventaram tudo de novo... mataram... derrubaram... gritaram... invocaram... e no grito, na porrada e no extermínio, a gente teve que reaprender tudo.
A gente não aprendeu nada.
A gente tá tentando... balançando... A gente vai dançando e cantando um pouco pra distrair...
A gente até tem fé.
A fé que vocês nos ensinaram, empurraram, desabaram.
Mas nem isso aprendemos.
A gente improvisa na fé também. As vezes é um as vezes é outro... as vezes são todos estes outros juntos.
Até que dá certo.
A gente acha que dá certo.
Na verdade, o senhor ja deve saber que não tem funcionado muito bem não. Tem tido muito deslizamento de terra, tiroteio, enchente, incêndio, rompimento de barragen, o escambau.
A gente até pediu orientação divina pra votar esse ano... mandaram um candidato... disseram ser do divino... Mas nem é.
Nem é.
Deu tudo errado.
A gente nem sabe o que é a peste.
O senhor deve entender a gente... Insegurança é nosso carro chefe.
O senhor vai falar e a gente vai tremer as pernas mesmo. Tremer ou abrir. O honesto treme, o desonesto abre mesmo. A gente queria mesmo era abrir enquanto treme.
Pelo menos.
A gente nem pedir no balcão sabe direito... nem dar informação... nem pedir... nem reclamar... reivindicar algo? Jamais.
A gente tem medo.
Medo de tudo.
A gente ou é bom de mais ou ruim de mais. Ou a gente é muito inseguro ou a gente se acha demais a fim de disfarçar a insegurança.
A gente até acha que sabe das coisas.
A gente é tudo inseguro.
Deixa a gente passar aqui, vai... pra ver se a gente aprende alguma coisa.
Pra ver se a gente volta e muda qualquer coisa.
A gente quer tanto ser como vocês.
A gente nem sabe com quem mais parecer.
A gente só quer...
sem nem saber mais o quê.
Deixa a gente entrar, vai?!
A gente vem lá do Brasil.

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